MOSTRANDO

SÓ PARA LEMBRAR, QUE ALGUMAS VEZES ESTOU POSTANDO NOS OUTROS ESPAÇOS DO SÍTIO, DAQUI. OU ESTOU ISOLADA EM ALGUM SÍTIO DE CÁ, FORA DO MUNDO BLOGAL.


Tenho postado AQUI ou AQUI

sexta-feira, 30 de julho de 2010

HOJE


Sem poder sair, por estar dependente de obrigações que sem querer, quis para mim, passo as horas passeando em mim mesma. No que fiz e faço, no que senti e sinto, nas minhas angustias que eventualmente avalio. Busco nos efeitos que demonstro, as causas do meu ser.

( a foto é da rua em que estou morando, terceira casa a direita, sejam bem vindos)

E por morar aqui, mais aumenta a contradição que sou.

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Mas acabo de descobrir que graças a amizade dos "amigos daqui" cada vez sou menos a Sra Urtigão e volto a ser um pouco mais do que já fui um dia.

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segunda-feira, 26 de julho de 2010

quinta-feira, 22 de julho de 2010

CRÔNICAS AMAZONICAS - 14



Andar de voadeira pelos Rios e Igarapés, é ótimo. É muito melhor do que andar de moto. Poder estar em uma Colocação no meio da Floresta é bom demais.

Ações antrópicas positivas e negativas
Nos rios e na Vila
Em que pesem todos os conceitos e aplicações de sustentabilidade, manejo florestal, responsabilidade ecológica e social, não há, entretanto, como evitar malefícios, potencialmente sérios à Floresta e seus caminhos, principalmente aos caminhos fluviais, quando se utilizam recursos tecnológicos, mesmo os mínimos, em uso no nosso modelo de civilização. E não estou me referindo às ondas eletromagnéticas dos modernos meios de comunicação, não. Estas, embora vários estudos sérios apontem no sentido de prejuízos à saúde do homem, como a relação entre a elevada incidência de casos de cãncer em moradores nas proximidades de antenas de telefonia móvel, por exemplo, ainda não tem seus danos aceitos de uma maneira unívoca pelas comunidades científicas. E caso tragam mesmo danos ao corpo humano, certamente tambem acarretariam prejuizos somáticos aos outros animais e até aos vegetais. Mas isso não se estuda, não se analisa. E como qualquer tecnologia que ainda não tenha produzido lucros suficientes para pagar o custo de suas pesquisas ou lucros que atendam à ganância do homem não será descartada, tais estudos não viriam ao conhecimento do homem comum ou não obteriam financiamentos para seu desenvolvimento. É sabido que o custo humano, a dor ou doença não é considerado pelas corporações, mesmo quando estes custos afetam significativamente os gastos públicos com a saude de um povo, de uma população.
Mas estou abordando aqui outras condições, como os meios de transporte pròpriamente ditos. O preço pago pelo Rio é grande. Não só o inferno sonoro produzido pelos motores a explosão, a gasolina e que certamente assusta e espanta os animais da floresta e das águas, interfere no equilíbrio da fauna, mas tambem a contaminação das águas dos rios pelos resíduos de combustivel, do óleo 2T usado pelos motores das embarcações ou pelo lixo abandonado pelos "caminhos", pelas pessoas que utilizam aquelas vias. Se Humanos jogam lixo nas ruas, imagino o que fazem nos rios , "que levam tudo". Mas tem tambem as marolas provocadas pelo deslocamento das voadeiras e que batem incessantemente nas suas margens, ondas que antigamente não existiam, contribuindo para intensificação da erosão das margens com incremento do assoreamento dos rios. Sem falar das lesões produzidos pelas hélices dos motores dos barcos, sobre os animais das águas. Ferimentos graves vitimam, por exemplo, o peixe- boi, o bôto, que quase não são mais encontrados, animais em vias de extinção como também alguns peixes da região . Passa-se rápido. Atropela-se sem ver o que foi deixado para trás. Ganha-se tempo, a nossa pressa incessante para chegar. Canoas a remo são obsoletas, hoje, para um ser humano que se acredita racional e civilizado e quer ou necessita chegar àquelas plagas. O nosso mantra favorito é "depressa, depressa".

Na vila existe um trabalho desenvolvido por moradores-pesquisadores que mudaram-se para lá, chamado de "saude ambiental". Lixeiras coloridas espalhadas em locais estratégicos, e um projeto onde um saco com lixo domiciliar limpo entregue à organização é compensado, pago com uma lata de leite em pó. Então o lixo é separado, organizado e...guardado. Um enorme galpão acumula todo o lixo inorgânico, produzido, quero dizer, levado para lá. Pets, sacolas plásticas, tetrapack. Esperam soluções para reciclagem efetiva. Apesar de produzirem bancos, cadeiras, brinquedos, artesanato, com material reciclado, não é suficiente. Não mandam o lixo de volta para a "cidade" pela consciência que as pessoas tem de que chegando lá, irá para um lixão. Então, de que adianta, argumentam. A Terra é uma só, nossa casa é o planeta, temos que ser responsáveis pelo que fazemos.
Os excrementos humanos e dos animais domésticos? Representam uma parcela menos significativa, aparentemente. As casas tem fossas, o esgoto, na sua maioria não é despejado no rio. Mas mesmo nessas condições, há contaminação do solo. Mesmo empregando técnicas de permacultura, com formas de produção de água cinza ou tratamento do esgoto, ainda são experiências isoladas que vem sendo introduzidas. Há uma demanda por "remédios de verme" ou seja, há contaminação dos seres humanos por parasitas intestinais. E isso vira um continuum.
A vila é privilegiada, pois com o movimento migratório ocorrido a partir dos anos 90 acontecem lá diversos projetos de pesquisa acadêmicos ligados à Universidades, especialmente algumas federais e ações significaticvas em vária áreas, como a do lixo e saneamento, projetos de manejo sustentável da floresta, produçaõ agricola de subsistência fundada nos principios da agrofloresta e permacultura, mas mesmo assim somos um cancro, a produzir feridas naquele sistema, já bastante vulnerável. Existe solução? Existe cura? Ou apenas cuidados paliativos, mais ou menos intensivos, dependendo da responsabilidade das pessoas que lá vivem ? Força de vontade, busca por soluções reais, poucas vezes eu vi em algum lugar, como vi por lá. Desejo e espero que a união daquelas pessoas não deixem enfraquecer estes projetos. Será seguramente um exemplo para aquela região, para a Amazonia, mas tambem um exemplo para o mundo.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

CRÔNICAS AMAZÔNICAS - 13



OS DOIS LADOS DA MOEDA

Utilizo a expressão em seu sentido metafórico. Não vou tratar de economia, pelo menos não diretamente.
Vivemos em um planeta onde a dualidade é uma constante, é o paradigma vigente e neste caso, imutável. Nosso modelo de existência funda-se tanto na destruição, na morte, quanto no nascimento ou construção. Quando falamos ou sentimos a beleza da natureza, perdemos o foco de todos os processos que subjazem àquela condição. Quando apreciamos a pujança da floresta, não pensamos que aquilo só se faz a custa dos processos de destruição para regeneração. Que a tão falada biodiversidade se funda nos processos de morte. A cadeia alimentar, por exemplo, é isso: para que uns sobrevivam, se torna necessário a morte dos outros. Para haver a fertilidade do solo, o surgimento de novos indivíduos do reino vegetal, é condição fundamental que folhas caiam das árvores, que árvores caiam ao solo, para que decompostos, alimentem o que vai germinar e crescer. Para uma nova árvore surgir em uma floresta é preciso que outra morra para abrir um espaço ao sol. Isso é a nossa idealizada "natureza", da qual fazemos parte, no mesmo processo de continuidade. Somos dependentes da cadeia alimentar, dos processos de morte/nascimento/crescimento/regeneração. Mesmo sem nos darmos conta, não habitualmente pelo menos, disso. Somos o ecossistema. Estamos em todos os ambientes, sejam quais forem. Mesmo na agitação de uma grande metrópolis, estamos participando - no sentido de pertencer, estar presente, de todos os biomas, do meio rural, agrário, do mar, pois dependemos diretamente deles para a existencia.
Por sermos "dotados de polegar opositor e telencéfalo desenvolvido" ou, seres de razão(?) costumamos achar que podemos dominar a natureza, colocá-la a nosso serviço, como se escrava fosse dos nossos desejos infinitos. E como se infinitos fossem tambem os seus recursos. Esquecemos que produção é dependente de regeneração. Que vida é dependente de morte.
Sempre ouvi dizer, não sei se fato ou ficção, que aprendizes em determinados mosteiros budistas são colocados para contemplar o processo de degeneração de um corpo físico, após a morte, para que tomem consciência da impermanência. Nosso modelo cultural helenocêntrico e eurocêntrico, há muito vem tentando esconder a realidade da morte. Ela, a morte e seus processos, fica oculta, ora entre paredes materiais, ora entre as paredes da (in)consciência, relegada a espaços o mais invisíveis possivel à nossa consciência cotidiana. Mesmo quando maciçamente bombardeados pelos noticiários especializados em tragédias, ela já criou um distanciamento, é parte "de lá" não daqui. É do vizinho, não nossa. Ou quando se vê animais esquartejados em balcões de um mercado e que deixaram de ser ou ter sido seres viventes para se tornarem mercadorias, produtos. É sempre "do outro". Sem nos darmos conta que parte das células do nosso próprio corpo morre todos os dias, todos os instantes. Morremos e matamos.
Porque, de repente me ponho a divagar sobre isto, aqui, nessas crônicas? Como se nada tivesse a ver? Engano. Nunca me senti tão intensamente conectada a estes processos como navegando por estes rios, ou caminhando pelas trilhas da floresta. Algumas horas navegando onde as águas, as forças da natureza promovem a destruição simultâneamente à regeneração, arrancando árvores e terrenos de um lado e construindo praias e solo fértil exatamente em frente, leva a mente a um estado meditativo, uma quase abstração, um afastamento dos processos psicológicos, do ego, e proporciona condições aproximadas de compreensão da realidade última de ser humano, e que eu não gostaria de esquecer.

domingo, 18 de julho de 2010

CRÔNICAS AMAZÔNICAS - 12


CONSIDERAÇÕES FINAIS
ou PENÚLTIMAS
Quando cheguei em casa, fiquei um pouco confusa. Afinal estivera tão pouco tempo lá e chego aqui descubro que se passara muito mais tempo do que eu sentia. O tal do tempo expandido que falo sempre ou de como se pode modificar e relativizar esta dimensão. Assim como o espaço. Mas de uma forma diferente, ainda não consegui compreender direito. Sempre digo que multiplico meus dias ao fazer muita coisa dentro deles. Quando acordo em um lugar, passo por outros, faço diversas coisas, vou dormir em outro, parece sempre que transcorreu muito tempo. Quando fico em casa com quase nada por fazer, o dia encurta. Lá, no entanto, aconteciam muitas coisas durante um mesmo dia, e no entanto os dias se somaram como se fossem um só. Fiquei lá, tres ou quatro dias e fora daqui tres semanas. Ainda estou me recuperando deste desconforto. Em minha mente estou no mes de junho, quando fui, talvez esteja no final do mês, mas não no meio do mes seguinte.
Existem coisas que me afetaram diretamente, nesta viagem, mas não sei porque, não couberam nos relatos anteriores. Então, vejamos:
Volto a falar do céu estrelado. Fico pensando na "necessidade" que temos de acender tantas luzes em nossas casas e cidades. Nem percebemos o quanto nossa iluminação apaga a beleza que poderíamos desfrutar se abríssemos mão disso. Mas temos medo. De bichos? De gente? Que mal evitamos com nossas luzes sempre acesas? Que tipo de ataques prevenimos com tantas luzes, com tanta iluminação? Pelo que vejo em estatísticas, pràticamente nada é evitado por iluminação pública ou domiciliar constante. Ou será que temos medo de nós mesmos e nos escondemos em luzes? Ou achamos que de alguma forma, com tanta lâmpada elétrica, nos aproximamos de alguma Luz especial? Só sei que um céu estrelado sobre escuridão absoluta, é o que Kant pensou descrever ao explicar o conceito de sublime. É muito mais do que Belo. É de tirar o fôlego. E isso, mesmo estando só. Imagino se em companhia de alguém amado. Vê-se "estrelas cadentes". Nem uma ou duas, basta estar a olhar para o céu. Há quanto tempo perdemos as possibilidades de ver alguma? Com o passar dos minutos, que sem percebermos tornam-se quase horas, a paisagem celeste muda, brilhos tornam-se mais ou menos intensos, as constelações que conheço mudam de lugar, minha imaginação cria outras.
E a lua? O luar? Consigo entender porque a Lua foi e é reverenciada como entidade divina. Saindo do "confôrto" do abrigo, dando-se alguns passos apenas, vendo seu cintilar nas folhas da vegetação, nas areias brancas dos caminhos, sente-se abrigado ao relento e acaba-se por aceitar a ideia de um Criador. Não é necessário questionar, raciocinar, racionalizar, está alí, tudo. Percebemos ao simples luar o quanto somos parte da natureza, não seus donos, apenas participantes. Que diferença , quando daqui, do litoral, novata que sou nestas plagas, saí de casa na lua cheia para ver seu brilho e reflexo sobre o mar e só vi a iluminação da orla. Andei mais e mais, para longe, buscando o que minha imaginação ou memória ancestral produzia, e nada. Uma desbotada imagem do que é, na verdade. Que tonta fui, lá, ao temer perigos imaginários (ou talvez aos micuins) e não ter ido até as margens dos Igarapés e suas lagoas para contemplar o luar. Nem sei se temia algo ou se, tão deslumbrada com o que via, nem pensei em mais nada.
Sim, a Floresta é mágica. E a cobiça destrói tudo, arrasa com a magia do mundo, destrói a felicidade, numa ganância sem fim, num desejo de poder, e que, verdadeiro, está alí, ao alcance do olhar, do sentir.


sábado, 17 de julho de 2010

CRÔNICAS AMAZÔNICAS - 11

Continuando no caminho de volta



Em Boca do Acre ( Amazonas), pegamos novamente o micro ônibus que nos levaria até Rio Branco, capital do Acre.210 Km. De passageiros apenas nós. Oba! Bastante espaço, para acomodar as crianças que estavam exaustas e mereciam um sono tranquilo. Mas quem disse que queriam dormir. Estavam mais dispostos a ver tudo que podiam do que podiamos imaginar. O trecho inicial em asfalto, em obras. Segundo soubemos pretendem asfaltar todo o percurso, mas estão em negociações com os autóctones, pois parte da estrada passa em área de reserva e eles não querem asfalto. Sábios que são. Têm consciência do tipo de desenvolvimento que a estrada asfaltada trará. Como o que de repente interrompe nosso caminho: uma imensa boiada sendo tocada pela estrada e suas margens. Mesmo com o peão tentando abrir caminho para o ônibus, demoramos um certo tempo para ultrapassarmos. Para delícia das crianças.




Mais um bom trecho em terra, e nosso ônibus pára, no sentido oposto vinha em uma caminhonete, o Mão Branca, responsável e proprietário do nosso transporte e que tinha sido o motorista da ida. Pergunta pelos americanos. Como? Parece que nosso motorista esquecera de aguardar os demais passageiros. Conversas, propostas de soluções e decidem; as passageiras que estavam na pickup e que se dirigiam para onde viemos - iriam para um curso avançado de "florais da amazônia" - passariam para o ônibus que voltaria a Boca do Acre para pegar os americanos e nós na pickup para Rio Branco. Quase deu vontade de esconder-me no ônibus e voltar... E como pula nos buracos o carro. Mais do que o ônibus. Agora teríamos que ficar um tanto apertados. Tres adultos e duas crianças, além do motorista.
Mas o entardecer naquela planície, dava vontade de fazer parar o carro, não estivéssemos todos tão cansados e se eu não soubesse que nosso motorista faria outra viagem, ainda hoje, com mais alunos para o curso.




Rio Branco parece ser uma cidade incrível. Na minha passagem, na ida, só vira o aeroporto. Agora ficaríamos um pouco mais de 24hs. Estava preparada psicológicamente para passear muito, andar até não sentir as pernas, fui dormir e ao acordar, cedo, adoecera. Uma tremenda gastroenterite, com febre e tudo. Felizmente, do nosso pequeno grupo, apenas eu estava assim. Não havia comido nada diferente deles, nem bebido nada diferente. Será que contraíra algo atendendo no posto? Arrastei-me por alguns pontos interessantes e que mal pude desfrutar. Febre, dor de barriga, naquele calor... Descansei no hotel durante a parte mais quente do dia quando eu me sentia pior, e triste pelo que estava perdendo, mas não dava mesmo. Vou ter que voltar, agora é sério. Mais tarde saí novamente. Arrastando-me e com medo de precisar de sanitários. Mas conheci alguns pontos muito bonitos. As margens do Rio Acre, a parte histórica mesclada com construções modernas voltadas ao bem estar da população, gostei mesmo.
A noite, na madrugada, saimos para o aeroporto, conexão em Brasilia e ...acabou!
Posso querer mais né, mesmo tendo sido bãodimaisss!
Como fazem meus netos ao fim de uma história: de novo ! Começa de novo! "Quéio mais"...





( 08 , 09 e 10/07/2010)

CRÔNICAS AMAZÔNICAS - 10






A VIAGEM DE VOLTA
O que dizer, além da enorme tristeza por ir embora?
Que as águas estão mais baixas, que alguns obstáculos a mais surgiram, a voadeira bate com mais frequência em troncos submersos, oscila mais, como se a própria natureza quisesse convencer-me a ficar. Resta-me apreciar as belezas das matas e das águas.
O processo é o mesmo, inverso, na fazenda troca-se a embarcação por outra um pouco maior e mais rápida, já lanchamos o que nos foi levado na despedida, uma deliciosa pizza de cenoura e cogumelos temperada com dendê. E adentra-se ao Purus. Agora é necessário transpor um banco de areia que na ida estava submerso, a barra do Mapiá. Vai, vai, e finalmente a voadeira passa ao outro lado, às águas do Cuxiuará.
Na ida, descemos o Purus, a favor da corrente e sobe-se o igarapé; na volta, descido o igarapé, sobe-se o Purus. Uma voadeira que segue quase com a gente, bate forte em algo oculto pelo Purus, felizmente nada grave, só um susto, estavam próximos demais da margem. E de repente começo a ver mais gente, um caminhão na praia, casas, como é possível, não vi nada disso na ida... Chegamos à Boca do Acre. Jáááá? Tão depressa assim? Os relógios mostram o mesmo tempo, a mesma duração. Meu coração não.





CRÔNICAS AMAZÔNICAS - 9


O ADEUS

Que espero muito ser um "até breve".
Já antes de sair, ao arrumar a mala, estava com dificuldades, coisa que nunca me ocorre. Gosto de voltar para casa, mesmo sabendo que quando chego, já quero partir de novo. Talvez porque nunca senti minha casa como um lar, um lugar para ficar. Sempre foi mais um abrigo de passagem. Durante muitos anos porque vivia quase tanto no trabalho quanto em casa, depois pelas oportunidades de viagens, que tanto gosto, e que a vida me proporciona. Nunca em nenhum lugar, me sentia em casa. Costumo dizer que o problema é que me perdi de minha tribo logo ao nascer e passo a vida procurando. Mas aqui foi diferente. Acho que uma grande parte da minha tribo veio parar aqui. Fizeram escolhas, vieram a partir dos anos 90, do sul, sudeste, norte, nordeste. Encontrei gente aqui de todos os lugares do Brasil e de alguns do resto do mundo: irlandeses, norte-americanos, paranaenses e paraenses, paulistanos, mineiros, cariocas , fluminenses, todos em busca daquele algo a mais que os aproxima da vida verdadeira. A afetividade demonstrada pelos vizinhos que se visitam sempre - aliás, a maior parte dos caminhos para as casas se fazem por dentro dos jardins das outras casas, pouco existem ruas. Ações que via em minha infância, como levar ao amigo do pão ou do bolo que voce fez hoje - e todos são amigos, sem distinções de classe social , ou distinções acadêmicas. Os doutores acadêmicos, escritores, partilham suas vidas com os ex-seringueiros e pescadores, com analfabetos, que ainda existem, principalmente entre os mais velhos e que vieram no primeiro movimento migratório trazendo uma imensa sabedoria da floresta e do homem; ou os que chegam agora, buscando esta "ilha de prosperidade" em meio à mata; a "lavadeira" convida quem lhe contratou, para um almoço de domingo, num domingo, e lá fomos nós, banho de igarapé - cuidado com a arraia, é preciso cutucar com uma vara o fundo de areia do igarapé, antes de se aventurar, os ferimentos que produzem são terríveis - e um almoço delicioso, simples com um tempêro divino. Embora exista televisão, não se perde o costume de visitar e prosear com os amigos. E são todos amigos. Foram muitas as visitas e retribuições. É "de lei"
Mas chegou o dia, não queria ter que ir embora, mas tenho outras pessoas a minha espera, compromissos ( irhc!). E não queremos pegar o Cuxiuará ( Purus) à noite. Ouvi cada história, de monstros e desaparecimentos inexplicáveis... Com pessoas reais, conhecidos de conhecidos.
Alguns dos que vieram no mesmo dia que viemos, já haviam partido, em outros dias, outros ficarão. Alguém busca meios para poder ficar de verdade.
Canoa carregada, lanches prontos, abraços, lágrimas engolidas, outras escapam, seguimos.


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quinta-feira, 15 de julho de 2010

CRÔNICAS AMAZÔNICAS -8





DAS CASAS










CRÔNICAS AMAZÔNICAS - 6


A Santa Casa
05/06/2010

Hoje, as segundas, é dia de mutirão na vila. Todos realizam atividades comunitárias: limpeza, capina, qualquer coisa necessária à comunidade e organizado pela associação de moradores. Fui dispensada da função Vovó, para atendimento no posto de saúde. Há já um certo tempo não há médicos aqui. Mas não vejo porque seriam necessários, já que há um Centro de Medicina da Floresta, com produção de medicamentos fitoterápicos, remédios florais da Amazonia, inclusive com referência internacional.
Conforme eu previa, mesmo tendo sido anunciado no alto -falante da vila o atendimento médico, só apareceram tres pessoas, buscando " remédio de vermes". O que me chamou atenção foi que as prateleiras de remédios - amostras grátis - dispunham de uma grande quantidade de medicamentos que em nenhum outro posto em que trabalhei em tôda minha vida "esquentavam prateleira". Ou seja, não há demanda por remédios, porque pouco se adoece. Fiquei sabendo que a oferta dos medicamentos não é grande. a demanda é que é inexistente.
Porém, a Santa Casa, local de atendimento espiritual à saúde atende a uma demanda regular, sempre. Investiguei, os indicadores de saúde são ótimos. Não há aqui o vício em doença. Aquela necessidade que vi tôda a minha vida profissional da afirmação psicológica e emocional através do adoecimento. Busca-se de fato condições de saúde.
O posto de saúde é próximo à Santa Casa, com gabinete médico, odontológico ( tambem não tem dentista - esse, sim creio ser necessário) e um centro de diagnóstico e contrôle da malária, com laboratório, funcionando, com equipe inclusive.
Já foi sonho antigo trabalhar assim. Em outras épocas, cheguei quase a transferir-me para a Amazonia, já tinha contatado emprêgo em outra região no entanto, mas fazer planos para a vida contraria os planos que a vida faz para a gente e não fui. Hoje em dia estou presa emocionalmente aos netos, aos filhos e filhas que não sairiam do sudeste maravilha e sou dependente da companhia deles. Mas continuo a sonhar, quem sabe, um ou dois meses ao ano, sonhos não devem morrer.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

CRÔNICAS AMAZÔNICAS - 5

em 21/06/2010, a tarde

Deus existe! E Êle é à minha imagem e semelhança. Como eu, Êle adora fazer jardins. E põe nisso tal desvêlo que por vêzes até esquece suas outras funções. Os jardins divinos que vejo aqui são a coisa mais bela que ja pude imaginar. Tal combinações e variedades de espécies, ou trechos e repetições, é algo que só um magnífico paisagista conseguiria imaginar ou fazer. Não é absolutamente acaso os jogos de simetrias, proporções, podas, estruturas das bases, tudo, tudo é perfeito.


27/06/2010, tarde

Vários tipos de mosquitos, pernilongos, carapanãs e sei lá mais o que, um calor terrível, carrapatos, restrições prolongadas ao meu ir e vir, tudo que detesto, e no entanto estou amando estar aqui. O que está me acontecendo? Não quero ir embora.

29/06/2010, manhã

Aqui voce fica perdido nas horas dos dias e nos dias. Não é só por conta do fuso horário, estranho, mas por uma estranha confusão produzida pelo sol e sombras. Custei a descobrir o nascente e poente. Nesta pequena clareira que comporta uma casinha e seu jardim, o sol é visto pelo reflexo nas copas das árvores, mais do que permite ser visto ao atravessar o céu.


29/06/2010, tarde

Uma caminhada pelas trilhas, no entorno da casa. Para todo lado vê-se referência às chuvas abundantes, os tempos de lama e atoleiros. Rampas de madeira sobre o solo agora seco. Passarelas sobre poças d'agua agora inexistentes. Só areia. Das flores, só sinto os perfumes, dos animais, só ouço os sons de rastejares entre folhas secas, os cricrilares e outras vozes. E os sons domésticos, galos, crianças, ferramentas.

30/06/2010, noite

Não chove, as águas do Igarapé estão cada dia mais baixas. Os dias estão cada vez mais quentes, mas eu esperava que fosse pior ainda. Alguns dizem que em continuar assim as voadeiras não poderão seguir. Será que meus desejos serão realizados? "Ficagem" compulsória?

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