Após a passagem cultural da compreensão da existência através de mitos para o modelo denominado razão, estabelece-se uma divisão e hierarquização dos saberes, um estatuto da diferença, onde o modelo dominante do ponto de vista político, leia-se aqui, bélico, define qual dos paradigmas adquire estatuto de verdade, de uma verdade que será determinada e imposta aos outros modelos culturais, suprimindo, ou tentando suprimir, as formas de conhecimento divergentes. E não pode ser verdade aquilo que não foi compreendido como tal pela quase totalidade daqueles que confrontam aquela possibilidade. Verdade tem que ser universal. Enquanto parcela, não é verdade.
Desde a divisão ou repartição do conhecimento criada por Aristóteles ( porque até Platão e principalmente nos pré-socráticos, o mito ainda era integrante do conhecimento do mundo) que este modelo estabelecido sobre a razão vem sendo imposto e assumido como única perspectiva do homem para o atingimento da verdade e do conhecimento, pelo menos na parte do mundo que sucedeu a dominaçao greco-romana e posteriormente cristã. Dominação esta obtida não pela clareza de seus princípios, mas estabelecida pela força e violência, a partir de uma tecnologia de guerra e destruição desenvolvida pela aplicação dos idênticos principios ditos racionais. Assim se construiu o modelo que ainda hoje desenvolvemos, de multipartição dos saberes, de desconhecimento dos outros valores, mesmo aqueles incluidos no paradigma científico. A maior parte dos estudiosos de uma área de conhecimento nega-se a buscar em áreas paralelas ou complementares uma integração deste saber, ao contrário, pretende estabelecer o seu fragmento como a unica perspectiva possivel de atingimento da verdade, e que desta forma por estar incompleta, se torna capenga e não se sustenta. É sabido que as ciências são constituidas de verdades transitórias, fundadas sobre conceitos deslizantes, mesmo aqueles estabelecidos após respeitados os critérios cientificos. Cabe, creio eu, aos sábios de nossa era, pós moderna(?), a compreensão de que urge um novo paradigma, não mais excludente, mas inclusivo, só assim será atingido uma possibilidade de, integrados os saberes, alcançarmos uma cultura abrangente, não uma globalização redutora, de poucos princípios, mas ampliando-se infinitamente o horizonte e renovando as perspectivas de uma raça que vem tentando a auto-extinção fundando-se neste modelo claramente falível e falido.
3 comentários:
Urtigão, colega (agora que já morri permito-me esta liberdade) concordo com você integralmente. O saudoso professor Roland Corbisier critica, também, os filósofos do sistema - os que o mantêm, e não colaboram para que evolua; todavia, muitas vezes é necessário repetir o mantra, para atingirmos a alma. Em Teilhard, "O Fenômeno Humano", os três círculos principais (bios/noos/holosfera) também se interseccionam, e na penumbrosa zona de transição ficamos muito tempo.
Agora uma reclamação: você e o Marcelão não estão me deixando desgarrar das peias que me prendem ainda ao mundo material: preciso partir para as nesgas do além, mas os quebra-paus têm sido tão excepcionais, que já arrumei com o Alto um acordo de permanência neste limbo espiritual em que me encontro, e subornei Caronte, para ele me dar travessia de volta do Aqueronte, apenas para vir vê-los.
Um ósculo respeitoso em sua destra, amiga!
Meu caro aSOMBRAção,
quem me dera ter seu conhecimento e erudição´. Por partidas assim é que se diz que os bons vão cedo. Teria sido melhor para nós que pudéssemos partilhar de seu saber mais diretamente. Mas não tendo outra solução, por hora contento-me com suas aparições.
Perdi muito do meu tempo estudando o que agora não me serve de nada.
Um grande abraço,e continue trazendo-me dados para orientar minhas leituras. Agradecida.
E como seria o esquema para que Caronte e Cérbero permitissem o seu retorno permanente? entre outras vantagens eles teriam menos trabalho e preocupações.
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